terça-feira, 23 de setembro de 2008

Da pena de lousa ao Magalhães

Hoje, bombardeado pelas referências noticiosas ao Magalhães, o computador para os miúdos da primária, dei comigo a recordar os tempos da minha escola primária e a evolução dos meios de escrita e de cálculo desde aí.

Sim, porque continuo a afirmar que o computador é uma ferramenta, como a esferográfica, que pode ser benéfico ou maléfico conforme o uso que se fizer dele. Não faz milagres nem substitui o professor.

Mas entrando nas recordações, quando entrei para a primária, em 1953, as escolas também não tinham aquecimento nem espaços desportivos, nem transportes, nem cantina, só que ninguém as fechava por causa disso. Escrevia-se nos cadernos e nas provas (havia várias sem que ficássemos psicologicamente afectados) com canetas de molhar no tinteiro, que fazia parte da carteira de madeira. As coisas temporárias de acompanhamento das aulas (principalmente contas) faziam-se num pequeno quadro de ardósia- a lousa -, onde se escrevia com um pedaço do mesmo material - a pena de lousa -, sendo que duas custavam 1 tostão.

Reprovava-se (ficava-se retido) em todas as classes, só se avançando se se soubesse mesmo a matéria.

Passado para o liceu, em 1956, já se escrevia com caneta de tinta permanente, o que nos conferia um ar "importante".

Quando, talvez por 1958, apareceu a esferográfica, foi considerada objecto pernicioso, sendo proibida nos pontos (testes), exames e documentos oficiais. Todos estes escritos tinham de ser feitos a tinta líquida azul. O regime abominava "modernices". Não obrigarem à pena de pato, já era um grande salto tecnológico e demonstração de modernidade!

Mais tarde, 1963, no ensino superior, já se podia utilizar a régua de cálculo, ferramenta utilíssima e bastante rápida para a realização de cálculos complexos. Nessa época, um computador ocupava um andar e não tinha maior capacidade que a mais barata das nossas calculadoras de bolso actuais. Não se vendiam. As empresas de informática - IBM, NCR - alugavam-nos aos bancos e outras empresas do género.

Hoje, nas discussões e comentários sobre o assunto, ainda lá estavam os que consideram o computador pernicioso - já aceitaram a esferográfica! - e causador de os meninos não saberem nada. Outros, no extremo oposto e com a mesma dose de ignorância, acham que ficam resolvidos todos os problemas da educação. Como se a ferramenta ensinasse alguém a trabalhar!

Se queremos formar os jovens para o futuro, claro que temos de os habituar a utilizar os meios do mundo moderno, o que não impede, pelo contrário, que saibam fazer os cálculos e a escrita de modo manual, até para programarem o computador.

Benvindo, Magalhães!

quinta-feira, 18 de setembro de 2008

Há cada explicação....

Há dias, a propósito da polémica das grandes melhorias na performance do ensino, que alguns ligaram ao "aconselhamento" aos professores para que não houvesse retenções (agora não se chama chumbo por razões ecológicas relacionadas com a nocividade dos metais pesados...), um senhor ministro, que se intitulou professor catedrático, veio negar quaisquer interferências do governo em tais matérias, mas defender o fim das retenções.

Dizia o senhor ministro haver um estudo que demonstrava que os alunos que estavam num ano escolar correspondente à sua idade eram melhores alunos que aqueles que estavam num ano escolar atrasado em relação à idade, concluindo-se que os segundos não eram bons alunos por terem sido retidos, colocando-os em anos atrasados.

BRILHANTE!!!!! Os alunos que estão em anos escolares correspondentes à sua idade não estão lá por serem bons alunos. São bons alunos porque estão lá!!!!!

Concluía o senhor ministro que, se evitássemos as retenções, colocando todos os alunos nos anos correspondentes à sua idade, acabaríamos com o insucesso escolar. Notável!!!

Seguindo o raciocínio do senhor ministro, se dermos a um licenciado em direito um certificado de doutoramento em física nuclear, corremos o risco de ter um prémio Nobel da física.

Para ajudar a dar-nos um nó na inteligência, vêm agora os senhores das petrolíferas explicar que os combustíveis aumentaram imediata e brutalmente devido ao aumento dos preços do petróleo, sendo irrelevante para o caso a queda livre do dólar em relação ao euro. Já quando os preços do petróleo baixam drasticamente, os combustíveis não podem baixar imediatamente devido à pequena subida do dólar em relação ao euro.

Então em que ficamos? A fórmula só funciona num sentido? A relação euro-dólar só é relevante para baixar os preços?

Para rematar as explicações esfarrapadas, parece que o governo não quer considerar na carreira de técnicos superiores (licenciados) os enfermeiros e técnicos de diagnóstico e terapêutica, cujos cursos são de licenciatura.

Porquê? Será por causa do título genérico de "doutor", usado abusivamente pelos licenciados em geral? Depois haveria confusões com os médicos, farmacêuticos e outros? Então e o "respeitinho"?

Será que há licenciaturas de 1.ª e de 2.ª?

Desculpem estes desabafos, mas tenho a sensação de que, ou me andam a tentar vigarizar ou estou atacado com o síndroma da PDI.

quinta-feira, 11 de setembro de 2008

Grandes lições...

Ontem, a propósito de uma experiência inédita no campo da física das partículas, que se diz ir dar uma ideia aproximada do que se passou imediatamente a seguir ao big-bang, tivemos oportunidade de assistir nos diversos canais de televisão a memoráveis lições de ciência e humildade.

Desde logo eminentes físicos explicaram a complexa experiência de modo a toda a gente perceber. Todos afirmaram não se tratar do fim das pesquisas científicas, mas do início de uma nova fase de investigação. Isto é, quanto mais se sabe, mais consciência se tem do que há ainda para saber. Posta perante o problema do início de tudo, uma cientista disse mesmo que se supõe que o big-bang foi o resultado do choque de partículas. Mas onde estavam as partículas? De onde vieram? Início?

Também proeminentes representantes da Igreja Católica se pronunciaram a favor dos progressos científicos, classificando as teorias criacionistas do "Génesis" de mitologia que nada tinha de científico.

Enfim, um dia memorável de humildade, onde se viu que as pessoas que realmente têm valor e saber o exprimem com simplicidade.

Grandes lições para todos nós, especialmente para aqueles que julgam que complicar as explicações os tornam credores de grande admiração.